sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Vendedores de artesanato tentam impedir mudança do Centro de Abastecimento

Vendedores de artesanato tentam impedir mudança do Centro de Abastecimento
Os produtos ficam espalhados, ocupando um espaço grande em frente às lojas
Juliana Vital
Patrícia Barbosa tem 30 anos, um filho e está grávida de seis meses. Ela nasceu dentro do Centro de Abastecimento, aprendeu a andar entre as lojas de artesanato da mãe e dos avôs. Foi lá também que ela aprendeu a andar de bicicleta, cresceu em meio aos tapetes de palha, cestas de cipó e produtos de artesanato bem representativos do Nordeste. "Aqui eu nasci e cresci e me formei como cidadã. Não sou somente uma comerciante. Eu me sinto parte de uma cidade, de uma cultura, da identidade de um povo", comenta.
Junto com outros 119 comerciantes, ela assinou um abaixo assinado da Associação dos Artesãos de Feira de Santana, para impedir a retirada dos comerciantes do local. A mudança é prevista como conseqüência da construção do empreendimento conhecido como Shopping Popular, que vai reunir 1.800 lojas e será erguido onde hoje existe o comércio de artesanato. A ordem de serviço foi assinada pelo prefeito José Ronaldo no último dia 14 e a obra deve durar de 12 a 18 meses, com investimento de cerca de R$ 55 milhões.
A loja de Patrícia tem produtos artesanais, como cerâmica, cestas de palha, tapetes, chapéus. Patrícia conta a história de décadas de comércio, parte vivida por ela, parte ouvida da mãe e da avó. "Aqui sempre foi um lugar de referência. Minha mãe me conta de quando os artesãos ficavam em outro lugar aqui no Centro, onde eram mais vistos. De repente foram trazidos pra cá e tudo mudou. Há 30 anos aqui dentro, posso dizer como isso aqui já foi muito movimentado e procurado por turistas e por pessoas de todo o país. Ainda somos procurados como referência cultural na cidade. Feira de Santana começou de uma Feira. Para limpar a cidade eles acabaram trazendo a feira pra cá pro Centro de Abastecimento. Isso daqui precisa ser revitalizado e preservado, e não destruído como querem fazer", critica.
Outro comerciante que trabalha com couro mas prefere não se identificar afirma que os artesãos não podem ceder o espaço que foi conquistado e preservado por eles há mais de 40 anos. "O Centro de Abastecimento tem vida própria. É preciso entender isso e perceber a importância deste lugar para a cidade", recomenda.
Na manhã de ontem um grupo de artesãos se juntou a ambulantes em frente à prefeitura e fechou o trânsito para protestar contra o shopping popular.
ALTERNATIVA
"A prefeitura já tentou nos retirar daqui, prometendo um lugar onde também não nos atenderia, um lugar totalmente descaracterizado, quase uma gaiola que hoje está inacabado. Depois afirmou que faremos parte do shopping popular, mas enquanto ele é construído não sabemos para onde iremos”, diz Patrícia, acrescentando que não pode ser um lugar qualquer.
“Não adianta um onde não tenha a característica do nosso produto. Eu não preciso de um lugar climatizado, pois assim vou ter que diminuir a variedade. Os meus produtos de couro, cipó, cerâmica, precisam de ar, de sol, de chuva, precisam estar expostos, senão apodrecem. Se eu for para um espaço de 5 metros quadrados, como está previsto para este shopping, vou fazer o que?”, questiona.

Comerciantes tentam tombar o espaço
Uma ação civil pública tramita na 2ª Vara da Fazenda Pública, com o pedido de liminar para impedir a retirada dos comerciantes da área de artesanato do Centro de Abastecimento. Eles querem tombar o local como patrimônio histórico e cultural da cidade, para impedir que seja alterado.
"A perspectiva da ação é preservar a área de artesanato e garantir o tombamento do local, além de preservar o direito de mais de cem pessoas que diretamente usufruem do espaço há mais de 40 anos e mais de 400 pessoas que indiretamente vivem de seus negócios ali. A área de artesanato do Centro de Abastecimento a nosso ver preenche todos os requisitos para ser tombada enquanto patrimônio histórico e cultural da cidade”, diz o advogado Cizino Oliveira.
A ação foi protocolada no dia 1 de dezembro de 2014, e segundo o advogado já houve a defesa do município que contestou a ação no dia 30 de março de 2015. "Esta liminar está ainda tramitando e espera apreciação do Poder Judiciário. O que nos estranha é que o município tendo conhecimento desta ação deu a ordem de serviço para construção do shopping popular. Quando existe uma ação judicial contra o município é aconselhável que se aguarde a tramitação deste processo para que se possa tomar uma posição como essa. Se eles têm tanta pressa, que se façam as devidas diligências junto ao Poder Judiciário para que haja logo a apreciação dessa liminar”, opina.
O advogado afirma que há um relatório emitido pelo IPAC (Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural do Estado da Bahia) dando parecer favorável ao tombamento, confirmando suas características culturais e sua importância para a história da cidade. "O nosso processo está muito bem fundamentado e tem provas concretas. Temos um abaixo assinado de mais de 500 pessoas que têm relação direta e indireta com aquela área. O município alega que há uma pesquisa apontando a aprovação deste projeto do shopping Popular, no entanto nós nunca tivemos informações de quais métodos foram utilizados nestas pesquisas e nunca tivemos acesso a elas, e com certeza ela não foi feita com o público direto e indireto daquela área”, contesta Cizino.

Novo espaço ainda indefinido
O secretário de Desenvolvimento Econômico, Antônio Carlos Borges, admite que não há por enquanto um local definido para relocar os comerciantes do artesanato durante a construção. Mas isto não seria um problema, na visão dele, porque ainda falta bastante tempo para que a transferência ocorra.
O secretário explica que a obra é pré-moldada e as vigas de concreto ainda estão começando a ser fabricadas e portanto há bastante tempo até que comece a instalação.
Para Antônio Carlos, a tese do tombamento não vai prosperar, porque segundo acredita, tombamento só pode ocorrer com imóveis de no mínimo 65 anos. O Centro de Abastecimento, erguido na década de 70, está longe disso.
Quanto às queixas dos comerciantes, ele argumenta que há dois anos a prefeitura vem tratando do assunto e já promoveu diversas reuniões em que muitos deles não comparecem.

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