Ser pedestre em Feira de Santana não é tarefa fácil. As calçadas da cidade estão ocupadas por barracas, carrinhos de mão, tabuleiros, cavaletes com propagandas de lojas e expositores de roupas, como manequins, araras e balaios. Quem trafega pelas ruas do centro, muitas vezes, nem precisa entrar nas lojas para adquirir algum produto, porque os itens ficam expostos nos passeios. Os vendedores ambulantes estão por toda a parte, comercializando frutas, verduras, temperos, hortaliças e mais uma infinidade de coisas. Quem anda a pé tem que disputar espaço e, além de esbarrar nas pessoas, precisa enfrentar todos esses obstáculos, que estão no caminho. Com a proximidade do fim do ano e das festas natalinas, a situação piora, já que o movimento no centro comercial aumenta consideravelmente.
A professora Kellyane Pereira, 24 anos, é natural de Fortaleza, Ceará, e mora em Feira de Santana há pouco mais de um ano. Ela afirma que os ambulantes dificultam a passagem dos pedestres, mas reclama também que não há espaço para transeuntes em muitos locais. “O que dificulta a nossa vida no centro da cidade é o fato de, praticamente, não existir calçadas em vários trechos. Há vias em que as calçadas são muito estreitas e, para piorar, os postes de iluminação tomam o espaço que é do pedestre. Somos obrigados a andar pela rua, disputando espaço com os carros e motos”, lamenta.
A cearense afirma que os pedestres de Fortaleza encontram as mesmas dificuldades que os feirenses, mas salienta que aqui a situação é pior. “Na minha cidade, também é muito comum encontrar camelôs nas calçadas e ver muitas pessoas andando no meio da rua. Aqui, no entanto, o descuido com as calçadas e com a população é bem maior. Feira de Santana, mesmo não sendo capital, é uma cidade grande e desenvolvida, portanto deveria melhor gerida”, compara.
Os buracos nas calçadas e os passeios desnivelados também chamam a atenção de Kellyane. “Todo mundo que anda pelo centro da cidade acaba tropeçando em algum trecho, mas, como sou jovem, nunca tive problemas sérios. Entretanto me coloco no lugar dos idosos e das pessoas portadoras de deficiência, que não têm a menor condição de caminhar pelas calçadas esburacadas”, lastima.
ACESSIBILIDADE - No centro de Feira de Santana, é possível localizar algumas poucas rampas sinalizadas com placas, mas os portadores de necessidades especiais acabam encontrando barreiras no caminho. Um exemplo é o cruzamento da Avenida Senhor dos Passos com a Rua Intendente Rui. Se algum cadeirante precisar passar pelo local, vai se deparar com barracas e vendedores ambulantes alojados nas calçadas, impedindo a passagem da cadeira de rodas.
Situação semelhante pode ser verificada na rua J.J. Seabra. Quem transita pelo local precisa disputar espaço com barracas e carrinhos de lanches e enfrentar degraus, buracos, telefones públicos, toldos e até mesmo cavaletes, instalados, pelos lojistas, nos passeios. Piso tátil e faixas em alto-relevo, que auxiliam a locomoção de pessoas com deficiência visual, são uma raridade. Nesta via, somente a calçada do prédio onde funcionava uma agência do Banco do Brasil possui esses equipamentos.
A locomoção de portadores de necessidades especiais e idosos também é uma preocupação da psicóloga Danielle Gois, 26 anos. “Tenho duas avós idosas que gostam muito de ir ao centro da cidade, mas, por conta dos problemas existentes nas calçadas, elas estão preferindo ir mais ao shopping. Também tive uma colega de faculdade com deficiência física e lembro que ela reclamava que sempre precisava de acompanhante para sair. Não tinha independência para ir sozinha ao centro de Feira”, disse.
Este problema é enfrentado diariamente por Antonio Carlos Moreira Junior, estudante de 16 anos. Cadeirante, ele precisa contar com a ajuda do irmão para transitar na cidade. “Nas calçadas, há muitos buracos, ambulantes e barracas. Já passei por diversas dificuldades e houve situações em que não consegui passar por determinados locais”, conta.
O irmão do estudante, Anderson dos Santos, 23 anos, também reclama da falta de acessibilidade nas ruas de Feira. “É bem difícil passar pelas calçadas sempre cheias de ambulantes e buracos. Também não encontramos muitas rampas e tenho que fazer força para subir e descer a cadeira de rodas dos passeios”, afirma.
MOBILIDADE URBANA - A lei federal 12.587, de 2012, estabelece uma Política Nacional de Mobilidade Urbana, com o objetivo de integrar mobilidade, acessibilidade e modos de transporte nos municípios brasileiros. A política estabelece princípios como acessibilidade universal, segurança nos deslocamentos das pessoas, eficiência, eficácia e efetividade na prestação dos serviços de transporte coletivo e na circulação urbana. Além de estabelecer como prioridades os modos de transportes não motorizados sobre os motorizados.
Professor de economia da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs) e da Faculdade Anísio Teixeira (FAT), Antonio Rosevaldo Ferreira, que é mestre em Desenvolvimento Regional e Urbano, esclarece que o conceito de mobilidade vai além do transporte coletivo e do uso de carros e motos. “Existe uma tendência muito grande a associar mobilidade urbana com meios de transporte. O conceito é muito mais amplo e consiste, fundamentalmente, no deslocamento das pessoas na cidade. É o acesso à cidade através dos modais que eu vou utilizar: posso ir a pé, então preciso de calçadas; se vou de bicicleta, preciso de ciclovias; e preciso de uma via para andar de carro, moto ou ônibus. E mais: se eu for de ônibus, preciso de cobertura e frequência”, explica.
Sobre as calçadas de Feira de Santana, o docente enfatiza que não são apropriadas à circulação de pedestres. “O ser humano não se desloca do mesmo jeito ao longo da sua vida. Uma criança de um ano se desloca de forma diferente de uma pessoa de 80 anos. E os modais vão mudando. As calçadas da cidade são para jovens de 15 anos”, observa, salientando que deveriam oferecer opções de locomoção a cidadãos de todas as idades. “É preciso ter um sistema de transporte coletivo eficiente, calçadas acessíveis e ciclovias, para desestimular o uso do transporte individual, dando ao cidadão a opção de deixar o automóvel em casa. E isso não seria difícil de implantar, porque Feira é uma cidade que favorece os pedestres e os ciclistas, por ser plana e por ter clima agradável no início da manhã e no final da tarde”, avalia.
Um plano de mobilidade urbana está em discussão em Feira de Santana. O documento, que está disponível no site da prefeitura municipal (www.feiradesantana.ba.gov.br), aborda questões como transporte coletivo, circulação, sistema viário e tráfego, ciclovias e pedestres. O secretário de planejamento de Feira de Santana, Carlos Brito, explicou que já foi feito um levantamento de todos os passeios da área central da cidade e das grandes avenidas, mas que, antes de qualquer intervenção, é preciso retirar as barracas e os vendedores ambulantes que atuam nesses locais. “Estamos esperando a conclusão do Centro Comercial Popular para requalificar os passeios e calçadas da cidade, incluindo a instalação de rampas e de piso tátil. É um projeto fundamental, porque as pessoas têm o direito de ir e vir”, garante.
O Centro Comercial Popular de Feira de Santana está sendo construído na área do Centro de Abastecimento, na Rua Dr. Olímpio Vital. A previsão é de que a obra seja concluída no segundo semestre de 2018. O projeto visa a retirada das barracas do centro da cidade e a transferência dos vendedores ambulantes para o empreendimento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário