Foto: Pablo Valadares/ Câmara dos Deputados
O ministro Paulo Guedes tem o selo de “trago verdades” estampado na testa. E esse comportamento pode enterrar a reforma da Previdência – pelo menos no formato esperado pelo titular da Economia. Não que ele esteja errado. Apenas verbaliza questões que dificultam a relação do Executivo com o Legislativo, em um momento em que a Câmara dos Deputados é crucial para que o projeto encabeçado por ele seja votado.
Na Comissão de Finanças e Tributação ontem, Guedes fez o registro que o Legislativo é privilegiado por seus funcionários terem salários às vezes 20 vezes maior do que o de um aposentado pelo Regime Geral da Previdência Social. Não falou nenhuma mentira. Concordo plenamente que é um absurdo a horda de privilégios que funcionários do Legislativo têm. Mas não apenas eles. Os do Judiciário e alguns poucos do Executivo também. No entanto, em meio a um processo de articulação política fragilizada, qualquer barulho pode atrapalhar a reforma. E a fala passou longe de ser apenas um zumbido: pareceu até um bumbo.
Não é novidade que o governo de Jair Bolsonaro patina nas relações com a Câmara e com o Senado. O próprio presidente deu demonstrações de que quer diminuir a animosidade, a exemplo da proposta de “pacto nacional” e da ida ao Congresso Nacional para entregar projetos do lei. Porém o seu entorno não parece muito disposto a ajudar. Paulo Guedes, por exemplo, não é estreante nessa disputa para ver quem azeda as relações.
O “superministro” da Economia já tentou emparedar deputados e senadores em mais de uma oportunidade. A última mais explícita foi quando sugeriu que, se o Congresso aprovasse uma “reforminha”, ele pediria o chapéu e iria embora do Brasil. O tom parece de uma criança birrenta, quando os pais negam um pedido. E não precisamos ser o mais esperto dos mundos para saber que o Parlamento não funciona sob pressão, independente de quem seja o “tirano” a fazê-lo. Guedes pode não ser esse monstro, mas se comporta de uma maneira a encrespar a relação já desgastada do governo com a Câmara e o Senado.
Por mais que haja validação do voto popular e o livre aval de Bolsonaro para que os ministros conversem com o Parlamento, é preciso ter certa cautela e ponderação. Na política, as relações se constroem com egos sendo domados e respeitados e, por essa razão, o desafio inócuo pode gerar mais dividendos do que efetividade. A cada nova ida de Guedes à Câmara, ao invés de diminuir a tensão, parece que os nervos voltam a ficar a flor da pele. É quase um teste para cardíaco.
A reforma da Previdência é um mal necessário e imprescindível para o bom funcionamento do Estado brasileiro. Não exatamente nos termos “exigidos” pelo ministro da Economia, um ultraliberal cuja preocupação social não parece estar no radar. E por mais que pareça uma cortesia dele ir à Câmara, é melhor tomar cuidado para que, ao invés de principal incentivador, Guedes não se torne o coveiro da reforma da Previdência.
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