Foto: Alan Santos/PR
O ministro da Justiça, Sergio Moro, distorceu reportagem publicada pela Folha de S.Paulo ao justificar neste domingo (4) a omissão de uma palestra remunerada na prestação de contas de suas atividades como juiz federal em 2016. Como a reportagem informou, Moro deu a palestra em setembro de 2016 e nunca cumpriu a obrigação de informá-la ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, embora tenha registrado sua participação em outros eventos externos naquele ano, incluindo palestras.
Uma resolução aprovada pelo Conselho Nacional de Justiça em junho de 2016 tornou obrigatório para juízes de todas as instâncias o registro de informações sobre palestras e outros eventos que podem ser classificados como "atividades docentes" pelas normas aplicadas à magistratura.
De acordo com a resolução, os juízes têm 30 dias para informar sua participação nos eventos e devem registrar data, assunto, local e entidade responsável pela organização. As normas do CNJ não obrigam os juízes a declarar a remuneração recebida.
Ao responder a questionamentos da Folha na sexta-feira (2), o Ministério da Justiça afirmou que a omissão pode ter ocorrido por "puro lapso", um descuido do então juiz, e observou que o sistema eletrônico criado pelo TRF-4 para o registro das palestras só começou a funcionar em 2017.
Questionado sobre o valor do cachê recebido pela palestra, o ministério disse que se tratava de uma "questão privada", mas acrescentou que a maior parte fora doada a seu pedido a uma entidade beneficente, o Pequeno Cotolengo do Paraná, e enviou comprovante de um depósito de R$ 10 mil efetuado pelos organizadores.
Neste domingo, ao comentar o assunto no Twitter, Moro afirmou que foi criticado por não ter registrado a palestra no cadastro eletrônico, o que não é verdade, e omitiu o fato de que as normas do CNJ tornavam o registro de eventos como esse obrigatório na época em que ele deu a palestra.
"Folha de São Paulo vê irregularidade pois a palestra de 2016 não foi registrada na época em cadastro eletrônico no Tribunal (Trf4), embora amplamente divulgada na mídia. Detalhe, o cadastro foi criado depois, em 2017. Pelo jeito, o cadastro é mais importante do que a caridade", escreveu o ministro.
Como a reportagem da Folha informou, Moro registrou no TRF-4 sua participação em diversos outros eventos em 2016, mesmo antes que o cadastro eletrônico criado em 2017 começasse a funcionar. Segundo o tribunal, Moro registrou 16 eventos, incluindo 9 palestras. A maioria ocorreu antes da palestra de setembro que ele omitiu.
Em 2017 e 2018, até abandonar a magistratura para ser ministro do governo Jair Bolsonaro (PSL), Moro declarou participação em outros 25 eventos, conforme os registros disponíveis no site do TRF-4. Em nenhum caso ele informou ter recebido remuneração. Um levantamento realizado pela Agência Pública em julho do ano passado encontrou notícias sobre 12 cursos e palestras que Moro havia dado sem informar ao tribunal. Ele registrou 5 desses eventos posteriormente, mas ignorou os outros 7.
O ministro também foi questionado pela Folha sobre essas omissões na sexta-feira, mas preferiu não fazer comentários sobre elas. Todas as explicações enviadas por sua assessoria na sexta-feira foram publicadas pela Folha. À tarde, Moro voltou a comentar o assunto, acusando a Folha de ter cometido erro na reportagem. Ele não apontou o erro e evitou apresentar novos esclarecimentos.
"Folha não pode simplesmente reconhecer que errou", escreveu. "Palestra à luz do dia, doação dos valores à caridade, pessoas com deficiência, valores declarados, cadastro de palestras do Trf4 criado só no ano seguinte, nota de resposta não publicada, nada a esconder." O ministro voltou a se manifestar sobre o assunto na noite deste domingo, também via Twitter, ao repetir uma informação que já constava da reportagem.
"Em 2016 não fui totalmente sincero. Escondi a doação à caridade decorrente da palestra, pois achei que poderia soar como inadequada autopromoção. Escusas agora pela revelação, mas preciso dela contra falsos escândalos. Há outras doações, mas os fatos importam mais do que a publicidade", escreveu Moro.
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