Foto: Reprodução / TJ-BA
Há pouco mais de seis meses, o Pleno do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) decidiu restringir os plantões para economizar até R$ 6 milhões por ano. Na época, a redução de horário de funcionamento foi criticada por alguns desembargadores por não contemplar questões de urgência. Após o deferimento de um habeas corpus durante um plantão, para colocar em soltura policiais presos acusados de tortura, a restrição voltou a ser discutida na sessão plenária do dia 9 de outubro.
A questão do tempo do plantão foi suscitada pelo desembargador Aberlado da Matta, após uma conversa com a desembargadora Márcia Borges, que dias antes havia deferido um pedido de habeas corpus na madrugada. Borges também relatou dificuldades para definir se agravos interpostos no plantão deveriam ser entendidos como casos de urgência para serem julgados no plantão.
Ainda não há um entendimento do TJ-BA do que deve ser tratado como urgência para ser julgado no plantão. Há apenas a orientação para casos de risco de morte ou “perecimento de direito”, uma expressão vaga e que pode dar margem a diversos tipos de interpretação. A maior questão, sobretudo, é o entendimento de concessão de habeas corpus ou não.
Segundo o presidente do TJ-BA, desembargador Gesivaldo Britto, “não adianta despachar às 3h ou 4h da manhã, porque o preso só vai ser liberado da delegacia, de penitenciária, de onde for, no outro dia, a partir das 8h da manhã”. “Não adianta, não é essa a urgência. Esse sobreaviso é para caso de internamento de urgência, sob risco de morte, perecimento de um direito”, ressaltou. Em março deste ano, Gesivaldo já havia feito uma declaração neste sentido: “Na parte criminal, nenhuma delegacia de polícia, nenhuma penitenciária solta preso entre 18h de um dia e 6h do dia seguinte. Segundo, em matéria cível, questão de saúde, nenhuma empresa de assistência médica, de plano de saúde, atende no horário noturno. Estávamos gastando um dinheiro desnecessário”, declarou na época.
Os desembargadores não discutiram se habeas corpus deve ser tratado ou não como um remédio jurídico de urgência, apenas que a expressão “perecimento de direito” era “muito vaga” e uma espécie de “cláusula em aberto”. Segundo a desembargadora Maria da Purificação, a resolução que restringe o plantão “é impossível de ser cumprida”.
O debate se deteve mais sobre o trabalho de filtragem do que seria emergência, tendo que abrir processo a processo durante os plantões para identificar as demandas, e se isso seria feito por um desembargador ou um servidor. A medida voltará a ser discutida em uma sessão plenária administrativa do TJ-BA. A falta de entendimento de que o Habeas Corpus está no rol do "risco de perecimento de direito” pode afetar as partes que têm direito a ter sua liberdade restabelecida em qualquer hora do dia.
Para a advogada baiana e uma das autoras do livro “Habeas no Supremo Tribunal Federal” , Mariana Madera, o perecimento do direito tem que ser alvo de uma atenção específica. "Depois da vida, o direito mais juridicamente tutelado e importante é a liberdade. Existem situações que o habeas corpus, que é uma medida para tutelar o direito de ir e vir, tem que ser analisado com urgência. Não é só o direito de um preso em flagrante, tem várias situações", comentou a advogada.
"Existem casos por exemplo, que uma pessoa está cumprindo pena no regime aberto e no local não existe local adequado para o cumprimento. A pessoa não pode cumprir a pena em um regime mais gravoso do que já foi condenada. Esse é um caso que exige urgência que tem que ser analisado imediatamente. Outro exemplo é de uma mulher que está recolhida em uma penitenciária masculina. São diversos casos que exigem um enfrentamento imediato. Deixar isso de lado é muito prejudicial", destacou Madera ao Bahia Notícias.
A determinação do TJ-BA, para a especialista, possui algumas ilegalidades que podem afetar alguns direitos do envolvido na ação. "O problema de uma determinação em que a priori não sejam analisados casos específicos é que isso gera uma ilegalidade. Como acontece no Supremo [Supremo Tribunal Federal], todos os habeas corpus que são impetrados nos finais de semana, feriados, nos recessos ou férias coletivas são submetidos a uma análise e aí se verifica se tem ou não uma urgência, dependendo da matéria. Então não tendo uma análise superficial da matéria para saber a urgência, isso implica em uma ilegalidade flagrante", explicou.
Baseando seu argumento na apreciação do STF na análise dos habeas corpus, a especialista entende que, na Corte, o recurso é um dispositivo regimental que tem uma previsão de que haverá uma atuação imediata em caso de urgência. "É uma questão do presidente [do STF], ou de quem esteja substituindo ele. É no sentido de analisar um caso urgente que enseja uma atuação do ministro plantonista. Se vê a importância de perceber que essas decisões precisam ser tomadas e não podem aguardar um ou dois dias, e se falando de liberdade, a tutela dela é muito importante. Ficar um dia sequer preso, não se devolve sua liberdade. Tem que se conhecer caso a caso", finalizou Madera.
Nenhum comentário:
Postar um comentário