Foto: Geraldo Magela/ Agência Senado
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, falou, de maneira tangencial, sobre a possibilidade de uma nova constituinte. A medida chegou a ser negada pela assessoria do presidente do Congresso Nacional, mas acabou confirmada pelo próprio Alcolumbre, horas depois da repercussão sobre o tema. Além de parecer absurda, uma reforma ampla da Constituição é algo que não deveria ser pensado em um clima de polarização atual. Ainda assim, não é a primeira vez que, sob tensão política, protagonistas da República evocam essa iniciativa.
Em 2013, no auge das mobilizações populares que tomaram as ruas, a presidente Dilma Rousseff propôs a elaboração de uma nova Carta Magna. Em menos de 24h, depois de apanhar da classe política e da opinião pública, a então moradora do Palácio da Alvorada recuou da ideia. Porém Dilma já era uma presidente extremamente desgastada e, por pouco, não levou o país a um ambiente de instabilidade social às vésperas da realização da Copa do Mundo. Baixado o fulgor das ruas, Dilma foi reeleita em 2014 e acabou defenestrada do Planalto dois anos depois.
A atual Constituição foi elaborada em meio a um contexto de muita esperança para o Brasil. Recém-saído da Ditadura Militar, em um processo doloroso de abertura democrática, o país vivia sob a expectativa de um futuro melhor, ainda que economicamente estivesse esfacelado. À época, Ulysses Guimarães liderou o processo de construção da Constituição Cidadã, que permitiu acesso a direitos fundamentais até então relegados. Com intensos debates e a participação de parlamentares ligados ao regime, mas também de líderes emergentes, a exemplo de Luiz Inácio Lula da Silva, a Carta Magna brasileira é progressista em diversos aspectos e, por mais que haja críticas, é uma das mais longevas da história do país.
Eis que, com forte casualidade, o presidente do Congresso propõe colocar a Constituição sob forte pressão. A fala de Alcolumbre veio em um contexto em que Câmara e Senado levantam discussões sobre a prisão a partir de condenação em segunda instância. A medida, reinterpretada pelo Supremo Tribunal Federal pela terceira vez em 11 anos, necessitaria de uma nova constituinte, pois se trata de uma cláusula pétrea. É esse o argumento do dirigente do Legislativo ao falar sobre a necessidade de revisar o documento, no uso explícito de um momento político para se aproveitar de maneira equivocada do poder disponível.
Como há um ambiente de exagerada tensão e dualidade entre os extremos – simbolizados publicamente pela extrema-direita do bolsonarismo e a esquerda com o lulopetismo –, mexer na Carta Magna nesse momento é um risco desnecessário para as instituições democráticas. As chances de um debate evoluir para uma convergência, algo essencial na construção de uma Constituição, são praticamente nulas no Brasil atual. Ainda mais com a baixa qualificação de muitos membros do parlamento – que nos remete ao saudoso Ulysses, que previu que a próxima legislatura seria ainda pior e já estamos há algumas eleições de quando ele profetizou isso.
No ritmo atual, inclusive, não duvidaria que fosse discutida a implantação de uma monarquia ou de um novo império no Brasil. Mesmo porque não faltam príncipes herdeiros para uma liderança que insiste em acirrar ânimos ao invés de acalentar o povo. A não ser que o Congresso Nacional se curve aos excessos de casualidades de que tem vivido o país.
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