terça-feira, 19 de novembro de 2019

'Tour' do Consórcio Nordeste precisa conter viés político para evitar novas tensões

'Tour' do Consórcio Nordeste precisa conter viés político para evitar novas tensões
Foto: Elisa Elsie/ Divulgação
Já fora do papel com a realização de uma primeira licitação conjunta para aquisição de medicamentos, o Consórcio Nordeste alçou um voo ligeiramente maior: atrair investimentos na Europa em bloco, numa espécie de acordo informal de independência. Os governadores nordestinos passam por França, Itália e Alemanha e tentam captar recursos estrangeiros para viabilizar obras de infraestrutura que precisam de aporte muito maior do que o capital público permite. Ainda mais em um contexto de continuada crise econômica, que supostamente dá sinais de melhora, mas não a ponto de ser perceptível no bolso da população.

Do ponto de vista econômico, é natural que haja essa espécie de acordo entre os governantes de uma região que divide problemas e interesses. O resultado da licitação de medicamentos, por exemplo, promete uma economia de 30% do valor total. É uma cifra expressiva, mesmo que os contratos de fornecimento sofram os tradicionais aditivos. Saúde e segurança talvez sejam as áreas onde essas conexões sejam mais facilmente sentidas. Porém outros intercâmbios, como na área de educação, gerenciamento de recursos hídricos e até gerenciamento de pessoal devem entrar no radar dos chefes de Executivo do Nordeste.

Porém, a estratégia dos governadores é ligeiramente arriscada do ponto de vista político. Não que a ida à Europa provoque grandes celeumas ou consequências. O contexto atual é que pode gerar tensões desnecessárias na relação da região com o restante do país. Desde 2018, quando houve uma das eleições mais acirradas da história, há um embate recorrente entre o Nordeste e o restante do país, com pinceladas de xenofobia e preconceito regional, intensificado principalmente após 2014, quando houve uma “separação” entre “eleitores do PT” e os “inimigos do PT”.

Não que haja qualquer mobilização para tornar os nove estados da região independentes. Longe disso, inclusive. Porém, a depender da forma com que acontece a comunicação, qualquer iniciativa no sentido de mostrar distanciamento do governo central do país pode incitar ainda mais cizânia entre os brasileiros. Por isso é preciso ter cautela com a repercussão política desse périplo de governadores pela Europa, que pode, inclusive, chegar à Ásia. Em um terreno fértil para a mobilização através de informações falsas, a eventual perda do controle narrativo pode criar situações difíceis de prever.

A formatação do Consórcio Nordeste é um desafio extra nesse processo. É a primeira vez na história recente que um “ente” interfederativo obtém destaque e entra em funcionamento pleno no Brasil. São inúmeros desafios e um dos principais é controlar eventuais críticas ao posicionamento político dos governadores, que têm divergências públicas com o governo de Jair Bolsonaro. Superada completamente a chance do uso inadequado do consórcio para gerar tensões desnecessárias com a União, o projeto tem tudo para dar certo.

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