A China voltou a restringir e confinar milhões de pessoas em seu território para tentar conter os novos surtos de Covid no país. Com uma média móvel de casos de aproximadamente 22 mil, o governo asiático tenta limitar ao máximo a circulação das pessoas, a fim de atingir o seu objetivo de "Covid zero".
Com isso, megalópoles como a capital, Pequim, com 21,5 milhões de pessoas, e Xangai, a maior cidade do país, com 25 milhões, impuseram lockdown e rastreamento de contatos para tentar reduzir novos casos e mortes.
Os números, no entanto, podem não ser muito elevados, comparados com a realidade do país: são, em média, 50 novos casos por dia em ambas as cidades. A média móvel de mortes nos últimos sete dias registrada foi de 38.
Porém, a política de controle rígido e testagem em massa acendem um alerta mesmo quando esses números, em uma imensidão de dezenas de milhões de moradores, não parecem tão preocupantes.
Por outro lado, o Brasil possui uma média móvel de casos de 14 mil nos últimos sete dias, e em torno de cem mortes (93 na última quinta, dia 5). Por aqui, as medidas de proteção da pandemia foram quase todas flexibilizadas, à exceção da exigência do passaporte de vacinação para frequentar alguns espaços.
Segundo especialistas, porém, os dois países não podem ser comparados diretamente. Primeiro, pelas divergências políticas —a China é uma ditadura comunista, o Brasil um país democrático presidencialista—, segundo, pelas diferenças culturais entre as duas sociedades.
Terceiro, e mais importante, é a forma de condução durante a pandemia. Desde o início, o governo chinês restringiu a circulação de pessoas e controlou quem entrava e saía do país. Além disso, pessoas com o vírus são monitoradas diariamente, assim como os seus contatos.
Isso fez com que a China reduzisse em poucos meses o número de casos, ganhando tempo até que a primeira vacina contra o vírus estivesse pronta para ser usada na população.
Já no Brasil, as diferentes estratégias adotadas nos estados e municípios culminaram em várias ondas da pandemia, aceleradas em parte pela introdução de novas variantes.
"Desde o início não houve dúvida que a China adotou uma política de eliminar a transmissão, enquanto o Brasil não fez nenhuma medida de controle para isso", afirma o médico sanitarista e ex-diretor da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) Cláudio Maierovitch.
Ele lembra que, embora ainda se buscassem nos primeiros meses da pandemia informações sobre a disseminação do vírus, a estratégia de isolar os casos e tentar retardar o processo de infecção já era conhecida como algo que funciona. "Aqui não tivemos plano, não tem projeção, não tem expectativa", ressalta.
O mesmo problema é apontado pela epidemiologista e vice-presidente do Instituto Sabin, Denise Garrett. "Houve uma diferença muito grande na maneira que os países abordaram a pandemia. E, por mais que não seja comparável a China com o Brasil, podemos comparar o Brasil com outros países que foram bem, como a Nova Zelândia, e tiveram um controle quase total dos casos, e outros que foram mal, como os Estados Unidos", disse.
Um ponto crítico aqui, diz ela, é que por muito tempo se buscou, de forma até defendida pelo próprio governo, a chamada imunidade de rebanho. "E qual a consequência disso? Tivemos, em um dado momento, mais de mil, 2.000 mortes por dia e agora, com uma média diária de cem, é um patamar que, digamos, torna-se tolerável, embora eu não ache que seja", afirma.
Porém, Garrett reforça que as políticas de lockdown da China neste momento põem também em risco a vida das pessoas, que, confinadas, não conseguem trabalhar. "É preciso um meio-termo. O lockdown no início da pandemia foi necessário para achatar a curva, ganhar tempo no combate ao vírus. Se houvesse mais empenho dos países, teríamos com certeza reduzido a transmissão do vírus. Mas é uma medida temporária também", diz.
Outro aspecto considerado é a cobertura vacinal —e, nesse sentido, o Brasil se saiu melhor. Enquanto no país mais de 90% dos idosos possuem esquema primário vacinal completo (duas doses) e, muitos, já receberam as doses de reforço, na China há locais em que menos de 40% dos idosos receberam as duas doses, e a política de reforço lá sofre.
Garrett reforça que, nos casos em que a vacina não impede a infecção —e, assim, em pessoas com comorbidades, imunossuprimidas ou maior risco, podem evoluir para casos graves e mortes— é essencial manter o uso de máscaras. "Não há mais nenhum questionamento sobre máscaras, elas são eficazes contra o vírus, sem nenhum efeito adverso a não ser o incômodo de quem está usando. E são formas de reduzir a carga viral para, mesmo vacinado, não ser um quadro de Covid grave", diz.
Garrett reforça que, nos casos em que a vacina não impede a infecção —e, assim, em pessoas com comorbidades, imunossuprimidas ou maior risco, podem evoluir para casos graves e mortes— é essencial manter o uso de máscaras. "Não há mais nenhum questionamento sobre máscaras, elas são eficazes contra o vírus, sem nenhum efeito adverso a não ser o incômodo de quem está usando. E são formas de reduzir a carga viral mesmo nos vacinados", diz.
"Na China eles tiveram muitas falhas em manter altas taxas de vacinação, com dificuldade de manter uma boa cobertura para alguns grupos e isso é um problema por lá, embora eles tenham medidas de controle de circulação do vírus mais eficazes do que nós", pondera Maierovitch.
Outro problema foi o uso na China, em sua maioria, de vacinas de vírus inativado, que possuem uma proteção menor especialmente nos mais idosos, pondo essa população em risco, lembra a epidemiologista.
Para Maierovitch, falta no Brasil, uma campanha mais a favor da vacinação. "Em todas as epidemias que tivemos a comunicação do governo era muito clara a favor de vacinação, na epidemia de sarampo, na de meningite, ainda nos anos 1970, e nesse aspecto tínhamos diretrizes muito claras. É claro que [para o governo] podemos conviver com cem mortes por dia de Covid, mas é um número ainda muito ruim; em uma semana morre por Covid o mesmo por dengue em um ano. Precisamos melhorar os indicadores", diz.
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