Principal evento anual da direita brasileira, a Cpac, encerrada neste domingo (7) em Balneário Camboriú (SC), teve como maior saldo político o reforço da estratégia dos bolsonaristas de enfrentar o Poder Judiciário.
Dois pontos interligados nessa pauta se destacaram: o perdão aos presos pelos ataques de 8 de janeiro de 2023 na praça dos Três Poderes e, sobretudo, a anistia ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), para que possa concorrer à Presidência daqui a dois anos.
O próprio Bolsonaro, em uma de suas falas no evento, se mostrou confiante em reverter a inelegibilidade decidida pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), apostando na mudança de composição da corte.
"A composição do TSE já mudou. Se tivermos uma grande bancada em 2026, pode ter certeza que a gente faz pelo Parlamento, não por uma canetada, uma história melhor para todos nós", afirmou.
Bolsonaro não explicitou o que quis dizer, mas o recado foi entendido por todos os presentes: a estratégia é fazer uma bancada numerosa no Senado, Casa que aprova ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e pode também levar ao impeachment deles.
Não por acaso, diversas pré-candidaturas bolsonaristas ao Senado foram lançadas, como as dos deputados federais Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Ricardo Salles (PL-SP) e Bia Kicis (PL-DF).
"Vamos cravar a estaca da direita no Senado, que está muito ideológico, muito esquerdinha", disse Salles.
Sobre o TSE especificamente, a boa notícia para os bolsonaristas foi a saída da corte, em junho, do ministro Alexandre de Moraes, algoz do ex-presidente. Na eleição de 2026, o presidente da corte eleitoral será o ministro Kassio Nunes Marques, um dos dois que foram indicados por Bolsonaro. O outro, André Mendonça, também estará na corte.
A estratégia é apostar na mudança do ambiente político para pressionar o Judiciário a ter decisões mais favoráveis ao ex-presidente, usando o que aconteceu com o hoje presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como parâmetro.
"Se o STF tirou o Lula, que é ladrão, da cadeia e o colocou na Presidência, por que não pode haver uma decisão que beneficie Bolsonaro, que não é ladrão?", disse o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS), ex-ministro de Bolsonaro.
"Vamos preparar o terreno para 2026, Vamos ter a maioria do Senado para dar um basta no Supremo Tribunal Federal. Chega de interferência", disse o deputado federal Zucco (PL-RS).
Menos explícito, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), pediu paciência à militância para que Bolsonaro novamente tenha condições de liderar o campo conservador em 2026.
"A direita está aqui, está unida e tem uma liderança, que é o presidente Jair Messias Bolsonaro. A gente tem de ser paciente na atribulação. A gente vai penar, mas a gente vai vencer", discursou.
Tarcísio é o principal nome colocado para disputar a Presidência caso Bolsonaro não tenha condições de ser o candidato. Mas, no evento, "plano B" era um tema proibido.
O que se viu foi uma sucessão de juras de fidelidade a Bolsonaro, renovando por pelo menos mais dois anos sua posição de figura indiscutível da direita brasileira. A única a mencionar a possibilidade, ainda que de leve, de ele passar o bastão foi sua mulher, Michelle.
"Diferente da esquerda, você não é egoísta, você está aqui para criar novas lideranças", afirmou, dirigindo-se para o marido.
A estratégia do campo bolsonarista, segundo lideranças presentes no evento, é ir construindo capital político passo a passo. Primeiro, com um resultado expressivo na eleição municipal de outubro, conquistando um número de prefeituras maior do que o lulismo. Em seguida, tentando costurar algum acordo com os candidatos a presidente da Câmara e do Senado para incluir a anistia na pauta das Casas em troca de apoio.
Por fim, apostando na erosão da popularidade de Lula em 2025, o que mudaria o sentimento das ruas e faria subir a popularidade do ex-presidente. Isso, com o auxílio de novas manifestações populares, ajudaria a jogar mais pressão sobre o Judiciário.
Num dos momentos mais ruidosos do evento, foi anunciada uma manifestação para 14 de julho na avenida Paulista contra a "perseguição" de ministros do STF.
Os bolsonaristas também esperam que os ventos internacionais sejam favoráveis, especialmente em caso de vitória de Donald Trump na eleição americana em novembro.
Não por acaso, a conferência esteve coalhada de convidados da direita global, vindos de países europeus, latino-americanos e dos EUA. Mesmo a decepção com o resultado na eleição legislativa francesa não diminuiu muito o entusiasmo com o contexto global.
O próprio Bolsonaro preferiu adotar uma cautela estratégica, pedindo calma com as especulações em torno de seu nome e dando a entender que há outros nomes nesse campo. "Apesar de ser messias, não sou salvador da pátria", disse.
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