quinta-feira, 22 de agosto de 2024

Mães atípicas buscam bem-viver e bons tratamentos para as crianças

                                                                                    


Registros de crianças nascidas com malformações congênitas no sistema nervoso central, como a microcefalia, diminuíram, mas as mães que vivem a realidade da doença buscam bem-viver e bons tratamentos para as crianças. As mães atípicas, como são conhecidas as mulheres que têm um filho com deficiência ou doenças raras, desejam proporcionar uma vida plena e digna para seus filhos.

 

Mãe do pequeno Ayo, 4, que tem microcefalia, Emily Araújo, 24, engravidou em outubro de 2019 e teve o bebê em junho de 2020. Ela relatou ter tido algumas complicações durante a gestação que contribuíram para o diagnóstico do filho: “Eu me tornei uma mãe atípica no momento do nascimento dele. Eu estava tendo uma gravidez um pouco complexa porque não tinha líquido amniótico, meu bebê não crescia, mas até então não havia recebido nenhum tipo de diagnóstico, apenas quando cheguei por volta das 34 semanas. Fiquei internada no hospital sob supervisão médica e, então, na 37 semana, meu bebê nasceu e, quando ele nasceu, veio o diagnóstico também”, contou a moradora de Cosme de Farias.

 

O Ministério da Saúde revelou que, entre 2010 e 2019, 6.267 casos de microcefalia ao nascimento foram registrados no Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc), resultando na seguinte estimativa da prevalência brasileira ao nascimento: 2,15 casos a cada 10.000 nascidos vivos.

 

Com a chegada de uma criança com deficiência na família, mudanças na rotina se fizeram necessárias. A cantora e compositora comentou sobre as alterações no dia a dia com a chegada do pequeno Ayo.

 

"Quando descobri que era uma mãe atípica, já comecei a ver as coisas de forma diferente. As primeiras mudanças foram que tive que adaptar minha rotina e meus afazeres baseados nas atividades que ele precisa fazer todos os dias, como a estimulação, fisioterapia, escola e tudo mais. Então, fui me informando tanto na internet quanto com as enfermeiras da equipe médica”, lembrou.

 

A artista também comentou sobre o acesso aos serviços públicos de assistência a familiares: “Quando ele nasceu, não conseguimos identificar o grau. A única coisa que eu sabia era o prazo de vida de 11 meses que o médico deu. Ele me explicou que microcefalia é uma condição em que a criança vive em estado vegetativo, não corresponde a muitas coisas e tem apenas esse prazo de vida. Por isso, não poderia solicitar recursos; tinha que esperar meu bebê completar 3 anos para pedir algo”, lamentou.

 

A partir desse evento, a mãe atípica não conseguiu recorrer a benefícios. Hoje desempregada, ela conta com o apoio da família e amigos para conseguir mantimentos, além de realizar serviços esporádicos. Ela pontuou que “atuar com carteira assinada afetaria a rotina de tratamentos do pequeno Ayo.”

  

UNIÃO E ACOLHIMENTO
Entre um médico e outro, mães atípicas se reuniram para desenvolver a Organização Não Governamental aBRAÇO à Microcefalia, pensada para acolher as crianças com microcefalia devido ao Zika vírus, mas também para prestar apoio aos familiares.

 

“A aBRAÇO começou com quatro ou cinco mães, depois foi crescendo para 10, e hoje temos 340 famílias associadas. O nosso foco é promover o acolhimento e apoio às famílias de crianças com malformação congênita no sistema nervoso central, buscando desenvolver ao máximo essas crianças e promover sua inclusão social”, contou Raniele Santos, coordenadora da ONG.

 

Os registros do Ministério da Saúde revelam que, entre os anos de 2015 e 2017 (período em que aconteceu a Emergência em Saúde Pública devido ao aumento na ocorrência de nascidos vivos com microcefalia no Brasil associada à epidemia do vírus Zika), foram registrados 4.595 nascidos vivos com essa malformação congênita.

 

Devido à má-formação, o número de sobrevida dos nascidos com microcefalia é baixo. De 2015 até 2024, 25 crianças que faziam parte da rede de acolhimento da ONG aBRAÇO faleceram. Contudo, Raniele contou que “não deixam de assistir à família só porque a criança veio a óbito". "Os familiares seguem recebendo apoio”.

 

Ao todo, a ONG atua com dois dias de atendimento, na segunda e na sexta-feira, com suporte psicológico, social e fisioterapêutico para as crianças da rede.

 

“Temos dois dias na semana de atendimento, segunda e sexta-feira, quando essas crianças fazem fisioterapia e fonoaudiologia, isso desde que a fundação começou. A gente não tem recursos próprios, dependemos sempre de pessoas externas, voluntários para ajudar nos serviços de saúde, participamos de alguns editais e empresas que doam para a organização, e assim conseguimos assistir às famílias e não deixar a luta parar”, disse Raniele.

DIGNIDADE E QUALIDADE DE VIDA
Com a aprovação do Projeto de Lei (PL) 6064, de 2023, que visa pagar uma parcela única de 50 mil reais por dano moral e uma pensão especial à pessoa com deficiência permanente decorrente de síndrome congênita associada à infecção pelo vírus Zika, as mães poderão respirar mais aliviadas por conseguirem dar melhores condições para seus filhos por meio do apoio financeiro.

 

“A aprovação do PL vai ajudar em muita coisa, não só a mim, mas a todas. Principalmente, a termos mais autonomia nos cuidados com as crianças. Hoje, os serviços do governo demoram, e quando recebemos, a criança já cresceu ou precisamos realizar alterações nas cadeiras ou órteses. Então, o PL vai contribuir para conseguirmos comprar um medicamento para crise convulsiva, um Uber para se deslocar até o médico, fornecer uma dieta adequada para as crianças. É muito comum mães deixarem de comer para dar aos filhos”, relatou Raniele.

 

A artista Emily Araújo também comentou sobre a aprovação do PL: “Esse PL é de extrema importância porque, me reconhecendo como uma mãe atípica, eu entendo que não consigo dar conta de um trabalho externo. Poder dar um bom tratamento ao Ayo sem me preocupar em me dividir com um trabalho seria muito bom. Tem detalhes e incentivos que minha presença pode diminuir a dificuldade na vida da minha criança.”

 

E acrescentou: “A gente tenta tirar o peso da deficiência e tentar normalizar, sabe? Deixar mais leve e estimular sempre a conversa”, concluiu a jovem. 

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