segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

Plano para manter refinarias com Petrobras esbarra no Cade e PT estuda alternativa

 O futuro presidente da Petrobras, senador Jean Paul Prates (PT-RN), avalia a possibilidade de romper um acordo com o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) para manter seis refinarias sob comando da petroleira. Os danos, no entanto, podem ser tão elevados que alternativas passaram a ser estudadas.

 

Uma das saídas analisadas pelos envolvidos nas discussões é vender as refinarias abrangidas pelo acordo firmado com o Cade há mais de três anos para, com o dinheiro arrecadado, outras unidades serem construídas.
 

Durante a transição, o PT chegou a pedir para a Petrobras parar com o plano de desinvestimento. Sob essa ótica, o fim do acordo com o Cade passou a ser a única forma de cumprir a promessa de campanha de Lula de ampliar a produção local de combustíveis para forçar a queda de preço, especialmente da gasolina e do diesel.
 

No entanto, se levar o plano adiante, a Petrobras voltará a responder a um processo sancionador que ficou suspenso com a assinatura do acordo com o Cade. As chances de a petroleira ser condenada por suposto abuso de poder econômico sã o grandes —motivo que a levou ao acordo no início do governo Jair Bolsonaro (PL).
 

A multa, especulam os técnicos do tribunal, pode ser muito elevada, e o desgaste na imagem da companhia, incomensurável.
 

Em contrapartida, há uma saída, segundo pessoas que acompanham as discussões no governo: seguir com a venda das seis refinarias restantes, conforme o combinado com o Cade, e usar os valores arrecadados para financiar a construção de novas unidades na mesma região.
 

Além de cumprir o acordo e aumentar os investimentos no setor, como deseja o governo, a medida também ampliaria a concorrência no setor. Isso porque as empresas que compraram esses ativos se tornaram monopolistas regionais e estariam vendendo combustível mais caro para clientes da própria região, que não têm outra alternativa para adquirir o produto.
 

Essas refinarias, no entanto, afirmam que essa situação só ocorre porque estão sendo obrigadas a comprar o insumo da própria Petrobras, que cobra mais caro. As importações, ainda segundo essas empresas, tornaram-se penosas diante da escassez do petróleo no mundo durante a pandemia, o que as tornou reféns da estatal.
 

Desde setembro de 2022, o Cade investiga a questão e a Petrobras está na mira. O órgão quer saber se a estatal prioriza suas refinarias com preços mais baixos —o que configuraria discriminação.
 

ANTECEDENTES
 

O acordo entre Cade e Petrobras foi firmado em 2019 e impôs a venda de oito das 13 refinarias da estatal, o que reduziria a participação da companhia no mercado a cerca de 50%. Hoje ela detém 98% do mercado, segundo o Cade. O plano de desinvestimento deveria ter sido concluído em 2021.
 

No entanto, até o momento, somente duas refinarias tiveram sua venda completamente concretizada, uma no Amazonas e outra na Bahia.
 

A venda de uma terceira, no Ceará, será analisada pelo tribunal do Cade depois de o conselheiro Victor Fernandes discordar da decisão da SG (Superintendência Geral) do órgão, que autorizou a venda. A SG instrui os processos que são julgados pelo plenário.
 

Diante da demora em se desfazer das refinarias, a Petrobras teve que pedir mais prazo para o Cade para cumprir o acordo, o que foi concedido.
 

REVISÃO DO ACORDO

Tecnicamente, não é possível rever os termos do acordo. Politicamente, o tribunal também não quer abrir qualquer tipo de exceção porque isso enfraqueceria o que se considera ser um importante instrumento de coibição de práticas abusivas de mercado.
 

Pelos chamados TCCs (Termos de Cessação de Conduta), a empresa recolhe uma contribuição pecuniária e se compromete a pôr fim às práticas consideradas abusivas. Em troca, o processo sancionador a que ela respondia fica suspenso. Assinado, esse acordo entra em vigor e passa a ser monitorado pelo Cade. Caso haja descumprimento, ele é cancelado e o processo volta a tramitar no tribunal até ir a julgamento.
 

No caso das refinarias da Petrobras, o processo foi movido por denúncia feita pela Abicom, a associação de importadores de combustível. Eles afirmaram que a empresa vendia combustível a preços muito mais baixos do que a média praticada em outros países —a chamada paridade internacional.
 

Essa diferença é que vem mantendo distorções de preços, tornando o combustível da Petrobras mais barato do que o da concorrência. Embora distribuidoras concorrentes da estatal tenham discordado da tese de que a concentração elevada (98%) levava a Petrobras a ser monopolista, a área técnica do Cade viu elementos que sustentaram a abertura do processo e que levaram, segundo técnicos envolvidos, à condenação à época.
 

Atualmente, esse assunto ganhou conotação política com a decisão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de derrubar preços de combustíveis por meio da redução de impostos, medida que foi encampada pelo Congresso e que poderia ajudar na reeleição do mandatário —que, mesmo assim, foi derrotado por Lula.
 

                                                                                  


O petista, que inicialmente criticou a medida de viés eleitoreiro, decidiu manter a redução de impostos por mais dois meses até que a política de preços da Petrobras seja revista. O futuro presidente da companhia, Jean Paul Prates, afirmou recentemente que não pretende fazer uma intervenção, mas ao mesmo tempo deixou claro que defende mexer na política de preços quanto à chamada paridade de importação.
 

Para ele, não faz sentido falar em paridade de importação quando o combustível está sendo produzido no país.
 

Em sinal de que está atento aos problemas enfrentados pelo novo governo, o presidente do Cade, Alexandre Cordeiro, pediu para que a SG abrisse uma investigação para apurar se postos subiram abusivamente o preço dos combustíveis na virada do ano.
 

A medida vai em linha com o que fez o ministro da Justiça, Flavio Dino, de enviar um ofício questionando distribuidoras de combustível sobre o assunto.
 

Cordeiro chegou ao Cade em 2015, durante o governo de Dilma Rousseff (PT), por indicação do senador Ciro Nogueira (PP). Desde então, ele já foi conselheiro e superintendente-geral. Ocupará a presidência da autarquia até 2025.

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